Com o Plenário Dirceu Cardoso e as galerias tomados de beneficiários diretos e herdeiros, a Frente Parlamentar (FP) em Defesa do Pagamento do Precatório da Trimestralidade realizou audiência pública nesta terça-feira (26). A falta de diálogo por parte do governo para que se chegue a um acordo, aliada à morosidade na resolução dos processos, levou entidades representativas a sugerirem uma mobilização para pressionar o Estado.
“O objetivo dessa reunião de hoje é debater e discutir, a partir de atualizações governamentais oficiais, os processos judiciais e a construção de proposições de acordo cabíveis e adequadas ao efetivo pagamento, recebimento dos servidores dos valores dos precatórios”, afirmou o presidente da FP, deputado Coronel Weliton (PRD).
De acordo com parlamentar, ao questionar o chefe da pasta da Fazenda, Benicio Suzana Costa, durante prestação de contas na Assembleia Legislativa (Ales), o titular informou que o Estado teria condições de arcar com os precatórios, “bastaria a decisão final desses processos que estão no âmbito judicial”.
Ao lado de Denninho Silva (União), Coronel Weliton lamentou a ausência de representantes dos Poderes Executivo e Judiciário Estadual, bem como dos deputados e senadores da bancada federal em Brasília. De acordo com o parlamentar, todos foram convidados para a audiência por meio de ofício formal enviado pela Ales.
“Desde quando foi criada a frente parlamentar, realizamos várias reuniões com associações e sindicatos, além do envio de ofícios ao Estado do Espírito Santo e à PGE solicitando agendas para dialogar sobre o precatório da trimestralidade, os andamentos de processos e atualizações do Conselho Nacional de Justiça. É imprescindível que o governo do Estado receba as entidades que representam os servidores públicos capixabas”, frisou o deputado.
Conforme o parlamentar, estabelecer uma agenda é importante para “o encaminhamento sobre as possíveis negociações visando ao pagamento dessa dívida”. Segundo ele, o precatório é considerado um “direito que foi relativizado” e vem afetando a vida de inúmeros cidadãos e a falta de resolução tem gerado ansiedade e dificuldade para os credores (muitos dos quais já morreram).
Foi aprovada na reunião a criação de um grupo de trabalho (GT) formado pelos presidentes dos sindicatos e associações dos servidores contemplados pelos precatórios. Segundo Coronel Weliton, entre outros objetivos, o GT será um espaço para os participantes estudarem formas de mobilizar as autoridades acerca do tema. “Nenhum de nós é tão bom quanto todos nós juntos”, considerou o coronel.
Falta de diálogo e mobilização
Convidados subiram à tribuna para relatar as angústias enfrentadas durante as mais de três décadas de andamento dos precatórios da trimestralidade na Justiça e a falta de informações precisas acerca dos 30 processos sobre o assunto – muitos dos quais julgados improcedentes. A falta de representantes do Executivo na reunião foi criticada pelas entidades.
A diretora do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Espírito Santo (Sindiupes) Noêmia Simonassi relatou sua decepção com o governador Renato Casagrande (PSB), que está em seu terceiro mandato. Segundo ela, mesmo tendo assinado uma carta na qual se comprometeu a pagar o precatório, até agora o problema não foi resolvido. “Não pagou, não sentou para negociar”, desabafou.
Para que os servidores sejam ouvidos, Noêmia sugeriu que os sindicatos fossem às ruas, mesmo no final do ano, para “fazer uma grande mobilização”. “Está na hora de a gente dar um basta e partir para outras coisas”, disse, “temos que partir para a luta, temos que ocupar as ruas como sempre ocupamos”, completou.
Representante da Associação dos Oficiais Militares do Espírito Santo (Assomes), Coronel Augusto Piccoli, lembrou da gestão pública estadual classificada como Nota A+ pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e lamentou que, apesar disso, a dívida com os servidores ainda não tenha sido quitada. “Não consigo entender o porquê”, pontuou.
Piccoli contou que no estado de São Paulo uma lei autoriza que o dinheiro do precatório seja absorvido para permitir a amortização de débitos tributários e que o recurso seja usado na compra de bens e serviços. “Por que o Espírito Santo não pode fazer isso?”, questionou. Diante disso, desafiou o Estado a criar uma lei para flexibilizar o pagamento do precatório.
A sugestão foi apoiada pelo presidente do Sindicato do Pessoal do Grupo de Tributação, Arrecadação e Fiscalização (Sindifiscal), Geraldo José Pinheiro, que criticou a longa duração dos processos. “Milhares de pessoas já faleceram”, observou. O auditor fiscal pediu diálogo com o Estado, que está saneado em termos fiscais. “Teria plenas condições de fazer o acordo”, opinou.
O presidente da Associação dos Militares da Reserva, Reformados, da Ativa da Política Militar, do Corpo de Bombeiros e Pensionistas do Estado (Aspomires), Capitão Guilherme Thompson de Mendonça, criticou a ausência, na reunião, de representantes do governo: “Tenham misericórdia desses que deram as suas vidas e clamaram agora por ver a justiça sendo feita”.
Para o presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Servidores Públicos do Estado do Espírito Santo (Sindipúblicos), Iran Caetano, o não pagamento dos precatórios é agravado por um processo de empobrecimento salarial. “O governo adota uma política de não recomposição das perdas salariais”, argumentou. Iran reforçou a falta de diálogo com o governo e endossou a mobilização dos servidores para chamar a atenção das autoridades.
O representante da Associação das Praças da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiro Militar do Espírito Santo (Aspra-ES), Sargento da PM Carlos Antônio Pereira dos Santos, afirmou que processos do precatório tiveram vitória jurídica, mas decisões políticas acabaram atrapalhando o desfecho do problema. Na opinião dele, Casagrande não tem interesse em negociar sobre o assunto, pois não pode tentar a reeleição. Santos também aderiu à sugestão de mobilização.
“Vamos dar o troco se esse governo não sentar à mesa para dialogar, reconhecer os servidores públicos como dignos (…) e tratar de uma negociação com o Estado saneado”, emendou o presidente do Sindicato dos Servidores da Assembleia Legislativa e do Tribunal de Contas do Espírito Santo (Sindilegis-ES), Leandro Machado, outro a ressaltar a Nota A+ do Estado no Tesouro Nacional.
A presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Espírito Santo (Sindijudiciário), Maria Clélia Almeida, também externou sua insatisfação com a falta de diálogo do governo. Para ela, o problema não é mais de âmbito judicial, e sim político. “Vocês estão desrespeitando toda a população capixaba”, avaliou. “É inadmissível que, após 30 anos de espera, o governador ainda negue (…) o direito à trimestralidade a servidores idosos”, protestou.
“O Conselho Nacional de Justiça tentou fazer com que o governador pagasse administrativamente todas essas ações (dos precatórios). Mas chegou a um ponto de o governador, junto com a Procuradoria, também interferir junto ao CNJ”. Conforme falou, o movimento do Palácio Anchieta foi feito para alertar que o órgão não tem competência para fazer uma conciliação, pois os processos estão judicializados.
“Não temos o que fazer judicialmente, a não ser esperar uma declaratória de que o que você esperou há 30 anos você vai perder e você ainda vai pagar por isso”. Diante do cenário, Maria Clélia adiantou que o sindicato está se organizando para levar os acontecimentos relativos ao precatório à Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Outros participantes também se manifestaram, como o presidente da Associação de Subtenentes e Sargentos do Espírito Santo (Asses), Capitão Neucimar Amorim; o presidente da Associação de Bombeiros Militares do Espírito Santo (Abmes), Capitão Emerson; e o vereador de Colatina Olmir Castiglioni (PRD).
Precatórios
Os Precatórios da Trimestralidade têm origem na Lei 3.935/1987, que previa reajustes periódicos aos funcionários estaduais (Executivo, Legislativo, Judiciário e órgãos como o Ministério Público) durante uma época de alta inflacionária. Como o governo da época não pôde honrar os compromissos financeiros, servidores acionaram o pagamento na Justiça.
Dos 30 processos, três tiveram desfecho favorável aos servidores na Justiça e, neste ano, chegaram a entrar na fase de cálculo a partir de uma audiência de conciliação intermediada CNJ, no entanto ainda sem conclusão. A medida contempla a Associação de Procuradores (Apes), o Sindipúblicos e a Asses.